quarta-feira, 28 de novembro de 2007

HISTÓRIA: TABAGISMO 2000's

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Para a OMS, preço do cigarro é "acintoso" - Especialista diz que o governo brasileiro deveria usar a política econômica para reduzir consumo e fortalecer a saúde.
O preço do cigarro no Brasil é "acintoso". A definição é da brasileira que atingiu o mais alto posto na luta contra o cigarro - Vera Luiza da Costa e Silva, 50 anos, gerente do programa de combate do tabagismo da OMS (Organização Mundial de Saúde), em Genebra.
Pesquisa sobre 88 países, divulgada ma ultima semana, confirma o acinte: o cigarro brasileiro é o sexto mais barato do mundo. São Paulo é uma das dez cidades no mundo, numa lista de 56, em que é mais barato comprar um maço de Marlboro do que um quilo de pão.
Para Vera Luiza, pneumologista com doutorado em saúde pública, o governo brasileiro precisa usar a política econômica, aumentando impostos sobre o cigarro, em benefício da saúde.
Folha de São Paulo - A OMS defende que o aumento do preço do cigarro é a medida mais eficaz para reduzir o consumo. Por que o governo brasileiro não segue essa recomendação?
Vera Luiza da Costa e Silva - Acredito que o governo ainda não tenha se definido politicamente em relação a essa política. Há o temor de que o aumento vá estimular o contrabando.
Folha de São Paulo - E não estimula? Vera Luiza da Costa e Silva - Ao contrário do que a indústria coloca, não há provas de que uma política de preços consiga desestimular ou aumentar o contrabando. Estudos do Banco Mundial mostram que até os países em que há contrabando conseguem reduzir o consumo quando aumentam preços. Controle de contrabando depende do combate à criminalidade.
Folha de São Paulo - Aumentar para quanto? Vera Luiza da Costa e Silva - É difícil dizer porque o preço do cigarro brasileiro é acintoso. É matemático. Quando diminui o preço, aumenta o consumo e aumenta o adoecimento.
Folha de São Paulo - Não falta coragem, para adotar uma medida antipopular? Vera Luiza da Costa e Silva - Acho que falta um amadurecimento político no sentido de a política econômica ser usada em favor da saúde.
Folha de São Paulo - Que avaliação a Srª faz das medidas antifumo adotadas pelo ex-ministro José Serra? Vera Luiza da Costa e Silva - O ministro tomou as medidas que poderia ter tomado na área da saúde. O Brasil tem hoje uma legislação de ponta no controle do tabagismo. A colocação do tabaco na Agência Nacional de Vigilância Sanitária foi extremamente importante.
Folha de São Paulo - Por quê? Vera Luiza da Costa e Silva - A Agência vai colocar a indústria para atender os direitos do consumidor, vai fazê-la diminuir teores de substâncias tóxicas e, num futuro, começar a controlar aditivos, pesticidas e outras substâncias que vão no cigarro.
Folha de São Paulo - A OMS tem alguma avaliação da propaganda de choque?
Vera Luiza da Costa e Silva - A experiência de outros países mostre que este tipo de publicidade funciona. Hoje, 30% das pessoas que tentam parar de fumar no Canadá o fazem por causa da publicidade chocante nos maços. A Austrália também deve uma publicidade externamente chocante, mostrando os vasos sanguíneos, cegueira por causa de cigarro e funcionou.
Folha de São Paulo - Não seria equivocado chocar o fumante e não oferecer tratamento, como se faz no Brasil?
Vera Luiza da Costa e Silva - A OMS recomenda que o fumante seja visto como um doente a ser tratado. O Brasil tem um passo muito importante a dar, no sentido de treinar profissionais da saúde para aconselhar e até, eventualmente, usar medicação para tratar o fumante.
Folha de São Paulo - Há quem diga que o tratamento é inviável por ser caro.
Vera Luiza da Costa e Silva - Nos países em desenvolvimento, como o Brasil, você não pode ter a pretenção de fornecer tratamento na rede pública pensando em remédio para deixar de fumar. Tem de treinar os profissionais de saúde para fazer acompanhamento. No caso de fumantes que tratam com medicamentos, você tem sucesso de 30%. Com aconselhamento, você pode conseguir até 20%. Ou seja, se você conseguir 10% numa população só com medidas mais simplificadas, está dando um passo imenso. No Brasil, seriam 4 milhões de fumantes parando sem gastar um tostão com remédio.
Folha de São Paulo - No Brasil, a claase média recporre a tratamentos com antidepressivo e substitutos da nicotina. São os melhores métodos?
Vera Luiza da Costa e Silva - Para de fumar é uma decisão complexa. O indivíduo tem que querer parar, e depende de suporte da sociedade. Droga deve ser usada para quem fez uma tentativa e não consegiu.
Folha de São Paulo - Por que o consumo de cigarro nos países ricos cresce só entre adolescentes e mulheres?
Vera Luiza da Costa e Silva - O cigarro ainda tem a imagem de libertário, de contestador. Ele se insere como uma cunha separando a vida infantil da adulta. As imagens de bem-estar, de sucesso e de sexualidade exploradas pela publicidade são pistas do sucesso entre os adolescentes.
Folha de São Paulo - Pela primeira vez na história, está havendo uma redução no consumo de cigarro em Estados americanos, como a California, e em países nórdicos. Qual é a consequência dessa queda?
Vera Luiza da Costa e Silva - Cai rapidamente a mortalidade por infarto e doenças coronarianas. Já a mortalidade por câncer de pulmão demora de 20 a 25 anos para ter uma queda.
Folha de São Paulo - Existe algum país-modelo no combate ao cigarro?
Vera Luiza da Costa e Silva - A Finlândia. Há 25 anos, uma região iniciou um programa de redução de consumo de tabaco, de gorduras saturadas, de aumento de atividade fisica e de consumo de alimentos saudáveis. Ocorreu uma queda drástica de mortes por infarto, por acidentes vasculares cerebrais e por câncer de pulmão. Eles foram criativos: deram incentivos fiscais para quem criasse porcos com menos gorduras, para quem fizesse margarina com gosto de manteiga. É um programa em que a economiaentra em peso. O Brasil tem de começar a pensar assim. Tem de decidir se vai investir em cultura do tabaco ou de alimentos saudáveis.
Folha de São Paulo - Há alguma experiência similar no Terceiro Mundo?
Vera Luiza da Costa e Silva - A África do Sul teve uma queda de consumo acentuada com aumento de preços. A Tailândia fez a mesma coisa. É a saída porque o cigarro consome boa parte do orçamento da saúde.
Em São Paulo, São Precisos 17 Minutos de Trabalho Para Manter A Dependência - Se na contra propaganda ao fumo o Brasil está ao lado do Canadá, o primeiro país a estampar fotos chocantes dos males do fumo, no quisito preço é o sexto mais baixo do mundo. Só perde para Indonésia, Senegal, Filipinas, Vietnã e Costa Rica.
O maço de Marlboro no Brasil é mais barato que na Costa do Marfim, no Gabão e em Camarões. A comparação aparece em pesquisa publicada na última semana na revista "Tobacco Control".
Em São Paulo, é preciso trabalhar 17 minutos para comprar um maço de Marlboro, segundo o levantamento. Só há quatro cidades onde o acesso é mais fácil.
São elas: Tóquio (09 minutos), Taipei (11 minutos), Zurique (12 minutos), Genebra (12 minutos).
Em São Paulo, é preciso trabalhar menos para comprar um maço de Marlboro do que um quilo de pão (27 minutos de trabalho).
Preços no Mundo (preço por maço do Marlboro regular ou marca internacional equivalente em março de 2001 - The Economist Intelligence Unit/Organização Mundial de Saúde)
  1. Noruega - US$ 6,48
  2. Reino Unido - US$6,24
  3. Irlanda - US$ 4,47
  4. EUA - US$3,71
  5. Austrália - US$ 3,46
  6. França - US$ 3,13
  7. Itália - US$ 2,70
  8. Espanha - US$ 2,16
  9. Portugal - US$ 1,86
  10. Brasil - US$0,85
  11. Costa Rica - US$0,75
  12. Vietnã - US$0,72
  13. Senegal - US$ 0,71
  14. Filipinas - US$ 0,67
  15. Indonésia - US$ 0,62
O Marlboro, O Big Mac E O Quilo do Pão: Quantos minutos é preciso trabalhar para comprar (o valor do minuto foi obtido à partir de uma média do salário pago por hora em 12 ocupações - Union Bank Of Switzerland/2000 e The Economist Intelligence Unit)
  • São Paulo/Brazil = Marlboro (17), Big Mac (36), 01 Kg de Pão (27)
  • Buenos Aires/Argentina = Marlboro (21), Big Mac (29), 01 Kg de Pão (23)
  • Sydney/Austrália = Marlboro (28), Big Mac (13), 01 Kg de Pão (13)
  • Santiago/Chile = Marlboro (38), Big Mac (62), 01 Kg de Pão (19)
  • Copenhague/Dinamarca = Marlboro (23), Big Mac (19), 01 Kg de Pão (12)
  • Paris/França = Marlboro (20), Big Mac (19) 01 Kg de Pão (17)
  • Mumbai/India = Marlboro (102), Big Mac 105), 01 Kg de Pão (34)
  • Nairobi/Quênia = Marlboro (158), Big Mac (178), 01 Kg de Pão (64)
  • Milão/Itália = Marlboro (26), Big Mac (21), 01 Kg de Pão (22)
  • Tóquio/Japão = Marlboro (09), Big Mac (09), 01 Kg de Pão (14)
  • Amsterdã/Holanda = Marlboro (19), Big Mac (16), 01 Kg de Pão (10)
  • Lisboa/Portugal = Marlboro (26), Big Mac (32), 01 Kg de Pão (15)
  • Madri/Espanha = Marlboro (21), Big Mac (21), 01 Kg de Pão (09)
  • Genebra/Suíça = Marlboro (12), Big Mac (16), 01 Kg de Pão (09)
  • Nova York/EUA = Marlboro (18), Big Mac (12), 01 Kg de Pão (15

Mario Cesar Carvalho

Jornal Folha de São Paulo/SP

Domingo

17 de Março de 2002

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