terça-feira, 3 de junho de 2008

Cocaina 80's

O QUE É COCAINA? - Poucas drogas têm recebido tanta atenção do público quanto a cocaina e suas variáveis. Revistas, programas de televisão e documentários realizados por gente famosa, como o oceanógrafo Jacques Costeau, entre tantos, falaram muito dela nos últimos anos. A cocaía contudo, não é uma droga nova; já era usada pelos índios da América do Sul muito antes da chegada dos conquistadores espanhóis. Há evidências arqueológicas de que os indios dos Andes peruanos utilizam à base de cocaína há mais de três mil anos. O tipo de cocaína usada hoje em dia, entretanto, só foi refinado em 1850, e suas propriedades estimulantes chegaram a ser muito apreciadas no século passado.O mito acerca da cocaína e seus efeitos é amplo e fantasioso; com exceção do trabalho do psicanalista Sigmund Freud, realizado a partir de 1880, suas propriedades farmacológicas e efeitos não foram estudados sistematicamente até 1970. Embora hoje conheça-se muito sobre a cocaina, as concepções errôneas ainda prevalecem, como a crença de que a droga é relativamente inofensiva. A cocaina é um alcalóide (substância química que contém nitrogênio, carbono, oxigênio e hidrogênio, extraído das plantas) branco e cristalino, derivado da Erythroxylon Coca, planta que cresce abundantemente nos Andes. A droga é extraida da planta em duas fases.
- Primeira Fase - as folhas são colocadas em uma prensa junto com ácido sulfúrico, querosene ou gasolina e comprimidas até formar uma massa, ou pasta, que contém até 90% de sulfato de cocaína.
- Segunda Fase - para remover as impurezas remanescentes, esta pasta é tratada com o ácido hidroclórico como solvente e produz o cloridrato de cocaina, branco e cristalino. O cloridrato de cocaína pode ser introduzido no organismo por aspiração, ingestão ou injeção. Apenas a cocaína pura costuma ser usada como fumo; nesse caso, ela deve ser submetida a um tratamento conhecido como "freebasing". Para isso, mistura-se o cloridrato de cocaína com bicarbonato de sódio ou água e hidróxido de amônia. A cocaína, considerada como uma base, é então separada da água por meio de um solvente volátil, como éter. A base de cocaína, ao contrário do cloridrato de cocaína, não é solúvel em água, e pode ser então usada como fumo.
Devido ao seu alto preço, considera-se a cocaina uma droga da elite. Em meados da década de 80, uma grama custava entre 50 e 120 dólares, e essa quantidade pode ser consumida em uma única noite por uma ou duas pessoa. O preço exorbitante, no entanto, favoreceu a associação entre o uso e pessoas fascinantes e ricas, e essa imagem foi, pelo menos em parte, responsável pelo aumento da popularidade da droga durante a década de 70, especialmente após 1976. Apesar do preço, a cocaína encontra-se presente em todas as camadas econômicas da sociedade. Embora o número de pessoas que usam cocaína pela primeira vez tenha se estabilizado, a crescente disponibilidade da droga contribuiu para o aumento da frequência e da quantidade consumida por pessoa. Como resultado, mais pessoas enfrentam problemas relacionados com a cocaína e procuram tratamento para se livrar da droga.
COMO A COCAÍNA É CONSUMIDA? - Apesar de muita gente acreditar o contrário, a cocaína é imediatamente absorvida pela corrente sanguinea quando ingerida por via oral. Os índios pré-colombianos que viviam na região andina mascavam as folhas de coca e até hoje esse é o principal modo de uso de cocaina nessa região. Um dos principais motivos que levavam os índios a usar a droga foi o fato de ela ajudar a vencer a sensação de cansaço e de fome. Como os efeitos da droga não são duradouros - de uma a duas horas, quando mascada -, os índios mantinham as folhas mastigadas dentro da boca, de modo que ao longo do dia fossem liberadas baixas concentrações de cocaina. Quando se mastigam as folhas, a cocaína é absorvida através das membranas da boca; se forem engolidas, a absorção faz-se no estômago e nos intestinos. Os índios peruanos misturam as folhas de coca com cal ou cinzas para facilitar a absorção da droga. Fora dos países produtores, a cocaína é mais frequentemente usada na forma de pó, que é absorvido pelas membranas mucosas da boca, pelos canais nasais e pelo trato gastrintestinal. O que explica a preferência pelo pó é a dificuldade para se contrabandear grandes quantidades de folhas de coca através de fronteiras. Consequentemente, é o cloridrato de cocaína, extraído das folhas de coca, que constitui problema fora dos países andinos, para onde é transportado e vendido ilegalmente. Para elevar os lucros, o cloridrato de cocaína costuma ser diluído ou adulterado com açúcares, anfetaminas ou anestésicos, produtos mais baratos e acessíveis nas regiões onde a droga será consumida. Assim, a cocaína vendida aos usuários tem uma pureza de apenas 12 a 75% e expõe o consumidor a outras substâncias, desconhecidas e potencialmente perigosas.
No final do século XIX, a cocaína às vezes era ingerida oralmente, após ser dissolvida em elixires e vinhos. Essas soluções eram anunciadas como drogas milagrosas capazes de curar todos os males, reduzir a fadiga e melhorar a disposição. Embora a cocaína possa provocar seus efeitos característicos quando ingerida em solução, eles são relativamente menos intensos que os efeitos provocados quando consumida de outras maneiras.
1)- A Via Intranasal - Atualmente a "cafungada", ou via intranasal, é o meio mais
difundido de consumir cocaína. Normalmente os usuários compram cocaína em pó, que é a forma mais comum do cloridrato. O pó é dividido em carreiras para facilitar a inalação; o usuário aspira-o através de um tubo. Poucos segundos após a aspiração, a pessoa experimenta uma sensação de adormecimento do nariz e depois uma "friagem", que dura aproximadamente cinco minutos. Ocorre então uma crescente sensação de alegria, euforia e energia. o "vôo" alcança seu ponto máximo em dez a vinte minutos e termina quase completamente em uma hora. Os efeitos estimulantes duram de vinte a quarenta minutos. Na tentativa de manter o "vôo", muitos usuários voltam a cheirar em intervalos regulares (a cada trinta minutos por exemplo), até que a droga se acabe.
2)- Via Intravenosa - Os usuários tidos como mais experientes ou de maior frequência administram a droga por via intravenosa. A dose normal costuma ser de 10 mg. Embora muitos dos efeitos fisiológicos e subjetivos da droga sejam os mesmos que os produzidos por ingestão intranasal, ao injetar a droga os usuários podem experimentar um "baque" (aceleração) intenso em apenas um ou dois minutos. Esse "baque" dissipa-se depois de trinta minutos, e os usuários frequentemente repetem a experiência injetando-se mais droga. Demonstrou-se experimentalmente e por meio de depoimentos de usuários que a via intravenosa exige uma dose menor em relação à via intranasal. Por outro lado, os usuários por via intravenosa ficam mais propensos a uma nova injeção para restaurar os efeitos. Em consequência, tendem a intensificar o uso até que eles próprios, ou o seu suprimento da droga, se esgotem. 3)- Cocaína Como Fumo - O hábito de fumar pasta de coca é comum no Peru, Equador, Colômbia e Bolívia, países em que esta forma da droga encontra-se amplamente disponível; aí, a prática de fumar pasta de coca transformou-se em verdadeira epidemia entre os adolescentes, principalmente do sexo masculino. Como é comum fumar compulsivamente, isso implica no consumo de grandes quantidades de droga. Os usuários peruanos, por exemplo, às vezes chegam a fumar 60g de pasta de coca de uma única vez. A pasta seca, que contém de 40 a 90% de sulfato de cocaína, é misturada num cigarro de tabaco ou de Cannabis Sativa (maconha). A euforia e o estímulo do Sistema Nervoso Central (SNC) são quase imediatos, por causa da rápida absorção da cocaína inalada nos pulmões. Entretanto, os efeitos agradáveis são relativamente passageiros e, mesmo que a concentração da droga no sangue permaneça alta, os fumantes de cocaína tornam-se ansiosos, irritáveis e deprimidos em poucos minutos. Para evitar essa reação indesejável, eles às vezes continuam a fumar pasta de coca por várias horas, embora dificilmente retornam à euforia inicial. A permanência do hábito de fumar cocaína pode trazer alucinações e comportamento psicótico. Além disso, muitas das impurezas da pasta de cocaína, como o querosene, podem ter seus próprios efeitos tóxicos. Até a pouco tempo atrás, o uso da pasta de cocaína - conhecida no Peru como PBC, iniciais de pasta básica de coca - não se tornou muito difundido fora dos países produtores de folhas de coca. Mas isso pode mudar, porque a pasta, que requer apenas um processamento rudimentar, é mais barata que o cloridrato de cocaína. Por outro lado, a venda da pasta de cocaína é certamente, muito menos lucratica para os traficantes, pois normalmente o cloridrato de cocaína apresenta-se adulterado, o que aumenta o lucro dos traficantes - é muito mais difícil fazer o mesmo com a pasta básica de coca. A pasta também é mais volumosa e, portanto, mais difícil de transportar.
O processo de freebasing, outra maneira de fumar cocaína, está se tornando cada vez mais conhecido (final da década de 80 para 90), principalmente nos Estados Unidos. O cloridrato de cocaína é convertido para uma forma que serve para ser fumada utilizando-se o processo químico já descrito. Fuma-se o freebasing em um narguilé, espécie de cachimbo d'água, da mesma forma como alguns usuários fumam maconha ou haxixe. Apenas 05 a 06 % da droga passam através do tubo do cachimbo, porque a maior parte da cocaína perde-se pela condensação e pela fumaça que escapa. Daí a necessidade de usar grandes quantidades de cocaína no processo de freebasing. Uma única inalação requer aproximadamente 100 mg, e os usuários às vezes consomem até 30 g ou mais num período de 24 horas. Fumar essa mistura é a forma mais cara de consumo de cocaína(década de 80 para 90). Por que, então, o freebasing tornou-se tão popular nos Estados Unidos nesta época? A principal razão alegada é que, da mesma forma que o processo intravenoso, este método produz uma excitação intensa. O processo de freebasing proporcionaria sensações subjetivas de vigor e prazer mais acentuados que qualquer outro método de administração. E também provoca um maior desejo por outra dose de cocaína do que a administração intravenosa. Mas o processo de freebasing é, também, a forma mais perigosa de abuso da cocaína. Vários estudos mostraram que o freebasing danifica os pulmões e desencadear sérios problemas de saúde, como a queima não prevista dos solventes inflamáveis usados no processo de extração da droga, que podem, eventualmente, provocar exploções com resultados fatais. O USO DA COCAÍNA: HISTÓRIA, EXEMPLOS, TENDÊNCIAS
Jarro de 1.500 anos de idade, que mostra um rosto com as bochechas cehias de folhas de coca, revela que o hábito de mascar estas folhas já existia entre a população indígena que habitava as montanhas andinas.
Muito antes da descoberta do processo da extração da cocaína, os índios do Peru e de outros países sul-americanos já mascavam as folhas da coca. Como não há registros históricos dessa prática, o conhecimento acerca do assunto nesse período deves-e a fontes arqueológicas. Os desenhos que ilustram peças de cerâmica encontradas em várias localidades situadas no noroeste da América do Sul fornecem evidências de que o hábito de mascar folhas de coca já fazia parte da cultura indígena antes da ascensão do império Inca, talvez já nos idos de 3.000 a.C., e que os efeitos da coca sobre a disposição e o comportamento eram apreciados pelos indios. A planta de coca era tida como um presente dos deuses e usada em rituais religiosos, funerais ou em certas ocasiões específicas. Um exemplo: como não existiam cavalos entre os incas, o único meio de comunicação entre as regiões do império eram os mensageiros. Eles corriam por longas distâncias nas montanhas andinas, onde até andar é difícil, devido a redução de oxigênio consequente da altitude. Os mensageiros, no entanto, conseguiam atravessar essas distâncias rapidamente, mesmo sem comida e água, mascando as folhas de coca. Quando os espanhóis chegaram, no século XVI, o império inca encontrava-se em declínio. Nessa época, a coca já não era mais usada apenas pela classe dominante ou associada aos rituais. Embora ainda ocupasse um lugar importante nas manifestações religiosas e culturais, há evidências de que muitas pessoas consumiam coca no dia-a-dia. Num primeiro momento, os espanhóis tentaram proibir os índios de mascar coca porque acreditavam que ela seria uma barreira para a conversão dos nativos ao cristianismo. Logo, entretanto, perceberam que poderiam forçar os silvícolas, já então escravizados, trabalhar arduamente nas minas de ouro e prata se permitissem o uso da coca, apesar das condições adversas proporcionadas pela altitude. Tornou-se, então, uma prática corrente pagar o trabalho dos índios com folhas de coca. Os espanhóis cultivaram a planta e, ao contrário da época do império inca, o consumo diário de folhas tornou-se muito frequente entre os índios. As folhas de coca foram levadas para a Europa pelos exploradores no século XVI, na mesma época em que outras substâncias psicoativas naturais, como o café, o chá e o tabaco, começavam a ser consumidas naquele continente. Mas, ao contrário destas substâncias, as folhas a coca não conseguiram popularidade até o século XIX. Isso deve-se, certamente, à sua deterioração durante o transporte. As condições dos porões dos navios durante as longas viagens, com muito calor e umidade, aniquilavam as qualidades do produto. Consequentemente, os efeitos das folhas de coca importadas eram reduzidos e não despertavam maior interesse.
A Sintese da Cocaína
Em 1885, o químico Gaedecke extraiu um resíduo oleoso das folhas de coca, e com isso produziu uma substância cristalina à qual deu o nome de "eritroxilina". Sete anos depois, Albert Neimann, assistente de Friedrich Wohler, o "pai da química orgânica", extraiu dessa substância a cocaína refinada. Apesar de já se conhecer a estrutura química da cocaína desde o fim do século XIX, somente em 1955 ela pôde ser comprovada. A incerteza acerca da estrutura química da droga sintetizada, porém, não impediu o seu consumo. O uso - e o abuso - da cocaína alastrou-se rapidamente depois que Niemann conseguiu efetuar o seu refino, e a pesquisa sobre os efeitos da droga, tanto em animais como em seres humanos, começou a ser incrementada. Em 1883, por exemplo, Theodor Aschenbrandt, um cirurgião do exército, escreveu exaustivamente sobre a utilidade da cocaína para acabar com o cansaço nas batalhas e fazer com que soldados feridos lutassem. Seu trabalho chamou a atenção de Sigmund Freud, então jovem neurologista vienense, que se dedicou ao assunto. Até bem pouco tempo atrás, a mais completa descrição dos efeitos psicológicos e fisiológicos da cocaína encontrava-se na obra de Freud, mais precisamente no "Uber Coca". Freud também fez experiências minuciosas acerca dos efeitos da cocaína na energia muscular, do seu tempo de reação e de sua influência na disposição psicológica.
Em 1862, Albert Nieman extraiu um alcalóide da coca, que denominou "cocaína". Logo apósa descoberta, iniciaram-se pesquisas detalhadas sobre os efeitos da droga e sua possível aplicação na medicina. Como resultado de suas pesquisas, Freud chegou a acreditar que a cocaína era uma droga miraculosa, capaz de curar vários males e de tornar mais agradável a vida normal. Em "Uber Coca", Freud sugeria o uso da cocaína para uma infinidade de propósitos terapêuticos, como:
= aumentar a capacidade física de uma pessoa durante períodos estressantes (isto é, em situações de guerra, em jornadas prolongadas, ao escalar uma montanha);
= restaurar a habilidade mental prejudicada pela fadiga;
= melhorar as "debilidades psíquicas", como a melancolia (termo antigo para "depressão").
Freud também recomendava a cocaína para distúrbios estomacais, mesmo aqueles que eram o simples resultado de uma refeição muito pesada, assim como para a asma e doenças supostamente causadas pela degeneração dos tecidos. As doenças que Freud e vários oputros médicos proeminentes do século XIX acreditavam poder ser curadas pela cocaína compõem uma lista realmente impressionante, o que provavelmente contribuiu para difundir a crença de que a cocaína podia curar tudo, até mesmo a sífilis. Mas a pretenção mais incrível, promovida pelo próprio Freud, era de que a cocaína poderia servir de cura para a dependência da morfina e do álcool. Para fazer tal afirmação, Freud baseou-se em informações obtidas, em grande parte, em relatórios publicados em jornais médicos. Folhetos promocionais de empresas farmacêuticas americanas divulgavam que "na cocaína temos um remédio cuja ação fisiológica e efeitos terapêuticos, conforme foi relatado por competentes observadores, não deixam dúvidas de sua grande eficácia no tratamento do alcoolismo, de sua ação específica no alívio para as vítimas do hábito do ópio". Freud também parecia convicto disso, e chegou afirmar que "o tratamento para a depoendência de morfina com coca, portanto, não resulta simplesmente na substituição de um tipo de dependência por outra; não transforma o dependente em morfina num coquero".
Freud (esquerda) receitou cocaína para combater a dependência em morfina de Ernst von Fleischl-Marxow (direita). O paciente, porém, tornou-se dependente de ambas as drogas e morreu intoxicado por morfina.
Os propalados benefícios da cocaína motivaram o surgimento, na Europa e nos Estados Unidos, de uma grande variedade de preparados à base de coca, inclusive tônicos e remedios patenteados. Um dos mais famosos era um vinho com coca comercializado com o nome de "Vinho Mariani", cujos anuncios citavam depoimentos de autoridades e gente famosa, como Júlio Verne e Thomas Edson, falando das qualidades do vinho. A Coca-Cola era outra bebida que continha cocaína. Era anunciada pela propaganda como "o tônico do cérebro e a bebida da efervescência intelectual". Embora a cafeína tenha substituído a cocaína da Coca-Cola, até hoje a bebida é aromatizada com folhas de coca descocainizadas.
Nas duas últimas décadas do século XIX, a cocaína desfrutava de boa reputação, mas na virada do século seu potencial de abuso começou a ser notado. Um dos casos mais trágicos foi o que ocorreu com um grande amigo de Freud, Ernst von Fleischl-Marxow, que era dependente de morfina. Depois que Freud o tratou com cocaína, Fleischl-Marxow mergulhou nesta droga rapidamente e começou a usá-la em demasia. Um ano mais tarde, ele estava tomando tanta cocaina que ficou com psicose tóxica e, mais tarde, veio a falecer. Embora o próprio Freud continuasse a usar a cocaína por muitos anos, ele e outros colegas, depois disso, passaram a escrever sobre os horrores da droga. Um cientista daquela época afirmou que a cocaína era "o terceiro flagelo da humanidade" (depois do álcool e do ópio).

O Papa Leão XIII e o escritor Julio Verne foram duas entre muitas personalidades famosas que elogiaram o "Vinho Mariani", uma mistura de vinho e de folhas de coca lançada em 1865.

Nos Estados Unidos difundia-se a crença de que o uso da cocaína pelos negros lhes proporcionava poderes sobre-humanos. Há notícias de que agentes de polícia do sul daquele país usavam armas de grosso calibre para se proteger da suposta ameaça dos negros que usavam cocaína durante disturbios de rua. Esse temor das monorias, junto com o conhecimento cada vez maior sobre o abuso da cocaína, teria levado os governos de vários Estados a restringir o uso da droga. Foi assim que, em 1914, o Ato de Narcóticos Harrison proibiu, em todo o país, o uso da cocaína em remédios patenteados e tornou ilegal o seu uso para fins recreativos. Como resultado dessas medidas, a fabricação, distribuição e o uso da cocaína passaram a ser estreitamente controlados. Desde os anos 30 até o fim da década de 60, o abuso de cocaína tornou-se praticamente inexistente, a não ser entre pessoas do meio artístico.

O inventor norte-americano Thomas Edison também elogiou as qualidades do "Vinho Mariani". Em 1988 a Coca-Cola, que então continha cocaína, era anunciada como "a bebida que acaba com a exaustão".

Há várias explicações plausíveis para essa queda do uso da droga, além da sua proibição. Em 1932, foi sintetizada a anfetamina, um estimulante psicomotor poderoso com propriedades semelhantes às da cocaína, e parece que essa droga substituiu a cocaína, pois era barata e fácil de se conseguir com os médicos, como parte de um tratamento para emagrecer. Mas a utilidade da anfetamina no combate à obsidade era secundária e, além disso, efeitos adversos graves, como danos cerebrais, puderam ser associados ao seu uso. Restringiu-se o acesso à droga quando, finalmente, percebeu-se a extensão do seu abuso. Em 1972, o Foo and Drug Administration (FDA) colocou a produção e distribuição da anfetamina sob rígido controle. E, como uma droga potencialmente perigosa, passou a ser receitada pelos médicos com muito cuidado.

A COCAÍNA NOS ANOS 70

Enquanto os males da anfetamina eram divulgadaos, algumas pessoas afirmavam que a cocaína não tinha efeitos tóxicos significativos. Poucas mortes por overdose de cocaína foram confirmadas, e parecia que alguns usuários de cocaína chegaram a procurar auxílio médico ou tratamento. O resultado foi que muita gente chegou à conclusão equivocada de que a cocaína era uma droga segura. Um relatório da Comissão Nacional de Maconha e Abuso de Drogas, de 1973, afirmava que não se observou grande ônus social provocado pela cocaína nos Estados Unidos. Devido à publicidade negativa sobre a anfetamina, que foi abandonada imediatamente, e aos boatos de que a cocaína parecia não apresentar a toxidade da anfetamina apesar dos seus efeitos semelhantes, esta acabou sendo redescoberta como uma droga recreacional na década de 70. O potencial de abuso da cocaína, no entanto, havia sido predito por vários especialistas. Os médicos D.R. Wesson e D.E. Smith afirmaram: "se a droga fosse mais prontamente disponível a a um custo substancialmente mais baixo, ou se rituais socioculturais aprovassem e incentivassem uma dose média maior, poderiam se desenvolver exemplos de abuso mais destrutivos". No início da década de 70, o abuso da cocaína ainda não havia se tornado um problema significativo. O uso era quase exclusivamente por via intranasal; a incidência de dependêncisa crônica era baixa; e não havia confirmação de evidências de mortes por overdose. Desde então, a situação mudou de forma dramática.

UMA EPIDEMIA DOS ANOS 80

Dados da Pesquisa Nacional de Domicílios, patrocinada pelo National Institute on Drug Abuse, dos Estados Unidos, indicam que aqueles que experimentaram cocaína pelo menos uma vez passaram de 5,4 milhões em 1974 para 21,6 milhões em 1982 - um aumento de quatro vezes. Em 1977 havia, aproximadamente, 1,6 milhão de usuários regulares (definidos como pessoas que usavam cocaína pelo menos uma vez ao mês), que aumentaram para 4,3 milhões em 1979. este último número manteve-se constante até 1982. A procura de tratamento e a incidência de crises que exigem assistência médica relacionadas ao uso da cocaína também cresceram dramaticamente desde 1976. Os dados que refletem o crescimento das consequências maléficas relacionadas à cocaína são coletados pelo National Institute on Drug Abuse através do Drug Abuse Warning Network (DAWN). Este sistema utiliza informações fornecidas por hospitais e prontos-socorros. Os dados do DAWN indicam que a incidência de problemas médicos e mortes relacionados à cocaína triplicaram entre 1976 e 1981, e houve um aumento assustador nas ocorrências de prontos-socorros causadas pela cocaína no ano de 1983. Além disso, a combinação de cocaína com outras drogas é citada como a causa de mais de 60% dos casos de emergência envolvendo a cocaína. De acordo com os relatórios do DAWN, a combinação citada em segundo lugar era o "coquetel", ou "dinamite" (mistura de heroína e cocaína). Entre as drogas usadas em combinação com a cocaínatranquilizantes, álcool e maconha. Pessoas com menos de 20 anos usam a maconha junto com a cocvaína com maior frequência. As inscrições em programas de tratamento para problemas causados pela cocaína aumentaram cinco vezes desde 1976. E essa tendência crescente pareceu continuar. Em 1983, 7,3% de todas as inscrições em clínicas de drogas eram devidos a problemas diretamente provocados pela cocaína, e esse número aumentou para 13,9% no primeiro semestre de 1984.

QUEM USA COCAÍNA? -

Os indivíduos que usam ou abusam da cocaína podem ser encontrados em todos so grupos raciais, geográficos e profissionais da sociedade, em qualquer parte do mundo. Um estudo de 1982 mostrou que os homens (28%) eram mais habituados ao uso da droga do que as mulheres (16,3%) na faixa etária de 18 a 44 anos, mas pesquisas indicaram que a diferença relativa ao sexo, dos consumidores está diminuindo. No passado, o uso da cocaína costumava ser associado a certos profissionais, como médicos, advogados, atletas e gente de teatro, cinema ou televisão. Seu alto custo transformava a cocaína no "champanhe das drogas", restrita a pessoas que dispunham de uma renda considerável. Com a maior divulgação da droga num passado mais recente, a maior parte dos usuários regulares de cocaína apresentava renda média acima de 25.000 dólares anuais, e muitos deles gastavam mais de 500 dólares por semana com cocaína. Em alguns casos extremos, indivíduos chegaram a gastar uma soma de 3.200 dólares numa única semana para manter a dependência da cocaína. Nem o status econômico nem a situação profissional parecem ser uma barreira considerável para o uso dessa droga nos dias atuais: 24,3% dos trabalhadores adultos empregados e 15,3% dos adultos desempregados usam cocaína nos Estados Unidos. Entre 1975 e o começo dos anos 80, o uso de cocaína também cresceu entre os estudantes secundaristas, mas essa tendência foi amenizada. No entanto, dado o fascínio associado à cocaína e a diminuição de seu preço, muitas pessoas temem que o uso da droga possa se tornar ainda maior entre os secundaristas.

PADRÕES DE USO - Muitos, se não a maioria, dos usuários de cocaína tomam a droga por finalidades sociais e recreativas. Normalmente ela é ingerida por via intranasal em festas onde as drogas, como o álcool e a maconha, também se fazem presentes. Um grupo menor de usuários consome a droga por razões mais específicas: diminuir o apetite, aumentar a energia, acabar com a monotonia e a depressão, melhorar a atividade e o desempenho normal de várias funções. A maneira como a cocaína é consumida mudou nos últimos quinze anos. Usava-se, anteriormente, a via de administração intranasal, e, em menor grau, a via intravenosa. Por volta de 1977 o freebasing com a cocaína entrou em cena, e um número crescente de usuários passou a preferí-lo. Mas o método de administração da droga predominante ainda é, de longe, a aspiração do pó. Entre os indivíduos que procuram tratamento para problemas causados pela cocaína, cerca de 16% fumam cocaína; 25% injetam a droga; e 57% aspiram o pó. Alguns estudos indicam que fumar cocaína ou tomá-la por via intravenosa leva ao uso compulsivo mais rapidamente. Isso não significa que aspirar cocaína não resultará em uso compulsivo, apenas fará esse caminho um pouco mais devagar. Há indicações conclusivas de que a grande maioria das pessoas que usam cocaína teve experiências prévias com outras drogas, principalmente com a maconha. Entre os indivíduos que usam cocaína, 98% também usaram maconha. E também a frequência do uso da maconha parece estar relacionada com a probabilidade de uso da cocaína. Quanto maior a frequência com que alguém consome maconha, mais propoenso estará a usar cocaína. Além disso, estes indivíduos consomem álcool e tabaco em quantidfade significativa. Dados de uma pesquisa realizada pelo Instituto Gallup indicam que as drogas mais frequentemente usadas em combinação com a cocaína são: álcool, maconha, tranquilizantes, opiátos e anfetaminas. Raramente o uso de drogas se restringe a um único tipo. A maior parte das pessoas que usa drogas psicoativas toma outras drogas, geralmente combinadas.

Tudo Sobre Drogas

Bruce Friedland

Editora Nova Cultural

1989

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